Antes de julgar a minha vida ou o meu caráter... calce os meus sapatos e percorra o caminho que eu percorri, viva as minhas tristezas, as minhas dúvidas e as minhas alegrias. Percorra os anos que eu percorri, tropece onde eu tropecei e levante-se assim como eu fiz. E então, só aí poderás julgar. Cada um tem a sua própria história. Não compare a sua vida com a dos outros. Você não sabe como foi o caminho que eles tiveram que trilhar na vida.
Clarice Lispector
Sempre ela,acho que muito do que ela escreveu me cabe feito luva,admiro demais a forma como Clarice soube viver entre o que tinha interno e o externo,mesmo que isso lhe custasse dias de depressão e angústia.
Mas, ai me pergunto quem não os tem nos dias de hoje???
Onde vivemos cercados de olhos que nos vigiam em redes sociais,olhos que nos julgam até por uma frase que postamos,e assim como um livro vamos sendo lidos,uns apenas olham a capa e já dizem se gostam ou não,outros mais curiosos vão ao conteúdo,ai esses sim tem o direito de falar se gostam ou não do que viram !!!!
Tem dias que fico inquieta,tenho tantos pensamentos para poemas, crônicas,contos,mas, nada quer vir parar no papel.
Deve ser porque o que consegue sair , fica trabalhado, já está "elaborado" como diriam os psicólogos.
Mas nem tudo que escrevo está elaborado dentro de mim de forma que não tenha me pesado,me feito sofrer ao lidar com esse olhar sobre o meu interno.
Não é fácil viver sobre o olhar do outro, o olhar inquisitor, julgador que a maioria coloca sobre nós.
A gente sempre exige das pessoas que ama e elas também tem esse direito sobre nós, porque à partir da indiferença vem também a descrença de que podemos mudar e melhorar.
Mas, nem sempre o que é a minha verdade ,é a verdade do outro,mesmo que ele esteja próximo a mim, a leitura interna é minha,e mesmo porque as verdades mudam e a cada dia mais me convenço disso.
O olhar que tenho sobre determinada situação não pode ser linear,não posso ser dono de verdades absolutas até mesmo porque elas não existem e isso já coube até a filosofia descrever.
Mas, me pego sempre sob a ótica de meu filho,que cobra de mim um trabalho,que eu saia de casa,volte a exercer uma profissão.
Imagine o quanto é contraditório.... ele faz faculdade de Economia e eu vivo hoje em dia da Arte.
Olhares dilacerantes entre o racional e o emocional.
Mas, eu sei os valores culturais que também ensinei a ele e por mais que ele tenha um mundo capitalista ao seu redor,ele tem também refinamentos internos para apreciar o belo, o simples, o que vem da alma e então nossas discussões são também digressões sobre a vida !!!
O que acho saudável, porque assim um, não inibe o outro em suas escolhas pessoais.
E se isso acontecesse geraria entre nós uma incomunicabilidade terrível e graças a Deus não é o que acontece!!!
Mas, vez ou outra não nego me incomoda ve-lo entrar aqui e falar: -mãe você precisa trabalhar!!!!!
Isso porque ele chega, estou de tintas até os cabelos,dentro de meu atêlie (seu antigo quarto,por sinal) que hoje tem mesas, armários ,estantes lotadas de tintas,apetrechos como ;pincéis,madeiras,telas e uma parede colorida que eu mesma fiz,enchendo de mandalas e borboletas!!!
Pois bem, ele acha que trabalhar não é acordar as seis da manhã,organizar a casa antes de mais nada,por roupas para lavar,limpar a sujeira dos cães,organizar a bagunça deixada na noite anterior sobre a pia, e ai sim,começar as minhas artes.
Ai vem,dar uma demão de branco,ir para o quintal e lixar,lixar,lixar até que tudo fique liso e pronto para receber a arte.
E essa tem que vir da criatividade,do bom gosto,do meu olhar sobre os materiais que tenho em mãos na hora e fazer algo que não tenha por ai pois, odeio cópias!!!
Eu tento não fazer caixas, tento fazer .."ARTE" nas minhas peças.
Se fosse para ser algo que tem por ai nem perderia tempo e iria sim, procurar um emprego numa loja, numa fábrica,numa empresa.
Porque existe sim uma grande diferença entre se ter um emprego e se ter um trabalho.
Eu tenho por profissão a fonoaudiologia,sempre fui autônoma,tendo meus horários mais flexíveis e portanto nunca tive um emprego com hora de bater cartão,cumprir metas e sair.
Fiz de minha profissão um sonho, estudava muito, lia, pesquisava,estava muitas vezes à frente de muitos médicos de minha cidade mas, era incrível ver as mães chegarem e falarem que o Dr.pediu para esperar que um dia a criança iria falar,iria pronunciar o "R" ...e olha que muitas já tinham quatro anos...e assim fui desistindo dessa profissão e assim lá se vão, mil casos que prefiro guardar a sete chaves,porque ter um título não quer dizer gostar do que faz e fazer por amor...aqui cito de novo a arte.
Porque toda e qualquer profissão precisa ser exercida com arte e amor,senão vira mecanicista,perde o humanismo da situação e esse sempre foi meu foco de atuação.
Mas, os médicos sabem mais que os terapêutas,assim como muitos filhos hoje sabem mais que os pais...estamos quase lá no:Quem nasceu primeiro,o ovo ou a galinha!!!!
E foi assim que comecei a me desapegar de minha profissão.Porque a arte, ela nasce com a gente que é sensível,quase que dê berço.
E quando me vi no meio das tintas, me soltando,criando,escrevendo eu me vi viva, inteira,verdadeira!!!
A arte literalmente me deu "asas de borboleta",sai desse casulo que muitos chamam de zona de conforto.
A arte literalmente me deu "asas de borboleta",sai desse casulo que muitos chamam de zona de conforto.
Abandonei sim tudo,não digo que é fácil ficar em casa trancada,muitas vezes descalça,cheia de tintas,cabelo num rabo de cavalo,unhas sem pintar,rezando nem para o porteiro nos ver!!!
Mas em compensação ganhei o canto dos pássaros que me visitam o dia todo no quintal enquento lixo as caixas,um pôr do sol lindo da janela enquanto pinto num fim de tarde, a música que me acompanha o dia inteiro onde viajo e deixo a inspiração me conduzir.
Ganhei ares de liberdade em minhas escolhas,eu que sempre tive um espírito livre acho que agora faço ele ainda mais feliz!!!
Na vida não temos respostas para o que nos basta, o que nos cabe,a cho que estou vivendo uma plenitude muito grande, o silêncio dos dias me fazem pensar na vida, me fazem ter a certeza de que não precisamos muito para sermos felizes!!!!
E muito menos deixar que nos convençam de que o mundo lá fora é somente capitalista,quando estamos casados com a arte,com a poesia que não enche barriga mas, inunda a alma.
Não quero ser mártir ,nem brincar de sair pelo mundo pregando que na vida vale somente as escolhas.
Porque a vida também nos esfola pelas nossas escolhas. Mas o olhar que pesa do outro dói muito mais.
E nossas crenças podem mudar sempre, depois que algo nos fere, nos tira do chão,nos impõe situações avessas tipo um caso de morte,uma doença terminal,uma perda do ser amado,ou mesmo uma perda material.
Ninguém gosta de ser julgado,ser questionado,ser tido como louco por não pertencer a uma maioria que se prendeu a rituais de trabalho e sabe que não é feliz assim mas, precisa ter para ser.... e não ser..para ter!!!
Por isso não gosto e nem julgo a vida de ninguém,vejo sim, pessoas vivendo de forma errada, distorcendo situações,
sendo amargas,críticas,infelizes e mesmo assim, não se lançam as mudanças, não se dão direito a novos ares, nessas situações julgar não é meu caminho,apenas, me lamento por elas.
Lembrei agora de uma frase da Elis Regina que diz assim:
( Imagem: Ekaterina Panikanova )
Adorei seu texto, diria que serve para muitas pessoas ao emprestar suas asas sensíveis. Nem todos conseguem voar no que é belo, até porque o belo é subjetivo, mas até o que nos magoa pode se transformar em Arte nas asas da borboleta (mesmo que para alguns ela seja invisível). Parabéns!!!
ResponderExcluirVou te seguir para depois te ler um cadinho mais!
Viver da arte que tanto ama! Quantos sao excluidos desse previlegio. Se permite minha opiniao, nao mude nunca. Curti sua cronica e partilho. Beijos...
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