sexta-feira, 30 de março de 2012

Retrato da Poesia



Cansada ia ela
nua pela vida
despida de certezas
- estas pestes que são mães dos preconceitos

cansada
mas não sem esperança

cansada
mas não sem aliança

muitas vezes julgada
outras tantas apontada
fez da poesia o júbilo maior

entregou-se de corpo e alma
a traduzir as emoções que estão no mundo
enxergando beleza onde só há virtude
palavras onde há quietude
raridade onde tudo é amiúde

nua a poesia assustava
trazia a gula além
das entrelinhas

sozinha aprendeu a cozinhar
aquecer a alma dos frios
senhores feudais

esqueceu ambiguidades
para ser feminina
e pulou o muro
das prisões medievais
agarrando a liberdade
feito substância

fez amor com o poeta
em noites enluaradas
conheceu os segredos
se esvaziou de mitos
dispensou carruagem

pegou lápis multi cores
vestiu-se de amores
esqueceu a primavera em flores

foi ser poesia pura
em plena guerra civil


 
 
Adriane Lima / Orlando Bona Filho
 
 
 
Arte by  Dino Vallas

quinta-feira, 29 de março de 2012

Um dia desses

 
Saudade palavra tão à toa
nem tradução ela perdoa
saudade da infância é coisa boa
quintal da casa de meu avô
e minha gangorra

Sob uma parreira de uva
eu ia e voltava das nuvens
e pedia : vô mais alto, mais alto
e ele me obedecia

sabia que o céu era o meu limite
e hoje lá de cima ele me assiste
ensinando segredos de felicidade
 
-não ponha o medo e nem a covardia
dentro de teus dias

na gangorra da vida
um dia a gente sobe
no outro está lá em baixo
emoções se guardam em caixinhas
para rever em finais de tarde

onde o céu é furta cor
e muitas marcas de amor
revelam essa saudade

  
 
 
 Adriane Lima 
 
Arte by  Andrei Markin 

Poema do tempo



Nunca sei ao certo
o real movimento
se é recuo ou volta
esse eterno tormento

fico atada
aos velhos detalhes
nunca estabelecidos
não sei se vou ou se fico
do que nem poderiam ter sido

as imagens que passam
os silêncios que elevam
as verdades compostas
muitas vezes trazidas
pela poeira do tempo

migalhas de meia lua
em mim assim flutuam
me deixando inteira
com gosto de lua cheia

escrevo no vidro da sala
sob a embaçada porta
versos que eram tão meus
verdades que foram mortas

histórias que eram compostas
palavras que escoavam
sem ter quem as contivesse
doce loucura em vão

talvez isso explique o vazio
da solidão e do frio
daqueles que não se prendem
em rótulos

 
 
Adriane Lima
 
 
Arte by  Jean Paul Avisse 

quarta-feira, 28 de março de 2012

Canto in poema

 

Pássaro, que me doaste as penas
para que minha dor 
fosse a de pássaro

pássaro, de emplumado luto
me lancei em céu sem voo

fui semente de música
plantada em solo surdo

notas embrulhadas
em papel de pão
das migalhas que me doava

era esperar o anoitecer
para me ver morrer
sem teu canto

pássaro do tempo
onde os pés eu fixava

tempo onde o amor
que me mostrava
era terno e me encantava

pássaro
arranquei minha penas
fiz delas um cocar
um véu de tristezas
por nós a rondar

pássaro, me escute :
pode ser que tudo mude 
a poesia pese 
os sentimentos voem

 eternamente
além das palavras
ouvirei o teu cantar



 


Adriane Lima


 
 
 
Arte by  Valery Belenikin

terça-feira, 27 de março de 2012

Crônica : Asas partidas


Queremos ter certezas e não dúvidas, resultados e não experiências, mas nem mesmo percebemos que as certezas só podem surgir através das dúvidas e os resultados somente através das experiências".

Carl Gustav Jung

 
Desde que o mundo surgiu,através de um “Big Bang”,nós,mulheres carregamos um grande peso,capaz de aniquilar qualquer ideologia  que existe sobre a face da Terra.
Hoje,pela manhã,deparei-me com um texto machista,extraído de um jornal. O autor começa dizendo assim: 
“ Volta e meia vejo mulheres encantadas com uma mudança no comportamento dos homens de hoje.Constatam elas,embevecidas,que os homens se transformaram em bons pais.E é verdade. Em geral,os pais da minha geração tratam os filhos com desvelo e carinho,ao contrário de seus próprios pais,que não se comoviam com crianças,nem com as que eles produziam.O que as mulheres não compreenderam ainda é que isso é fruto da infalível lei de compensações da Natureza.Os homens de hoje,são melhores pais porque elas,as mulheres,são piores mães. Os homens cozinham como antes não cozinhavam,cuidam da casa como antes não cuidavam e tratam os filhos como antes não tratavam porque as mulheres deixaram de fazer tudo isso tão bem como faziam”.




E muitas “cositas “ mais desse gênero!
Bem,após ler tudo isso,pensei:”achei a chave mestra da evolução...”
Certamente,também fomos nós mulheres as causadoras do desaparecimento dos dinossauros,só pode!!
Todas as vezes que me deparo com questões tão descabidas,distantes das que aprendi,não sei se continuaria dando minha cara à tapa,ou se não sou desse planeta estranho e devo ,realmente me calar!
Acredito demais no “inconsciente coletivo”,tão citado por Gustav Jung .Ele diz que esse inconsciente é constituído por conteúdos universais e que é a base da  psique,sendo uma condição imutável,idêntica em toda parte.Logo,já trazemos dentro de nós a crença de que o homem não é uma ilha e precisa do seu semelhante para crescer,aprender,evoluir.Hoje, felizmente,o mundo se  expandiu,as pessoas se encontram,seja pessoalmente,seja através das redes sociais,trocam informações,conversam ,divulgam ideias.Mas,ainda me assusto quando leio ou escuto sobre questões da família moderna,criação de filhos e de espaço individual.
Nas rodas de amigos,que nasceram entre os anos 50 e meados de 60,como eu,a família era tradicional,”redonda”,com pai e mãe unidos,embora sofrendo calados as diferenças individuais.Resignados,já que o importante era manter a união estável.Provavelmente, muitos de nós ouvimos nossos pais reclamarem do cônjuge,falarem de que gostariam de sumir de casa,que a vida estava insuportável ,mas aguentavam “heroicamente”por viverem numa sociedade machista,onde ao homem tudo era permitido,restando à mulher,a submissão.”até que a morte os separasse.”
O mundo evoluiu e com ele,os relacionamentos amorosos,a maneira de viver o amor,não mais patriarcal,mas entre duas individualidades que buscam se realizar juntas.Começamos a entender o poeta ,quando diz nos seus versos sobre o amor:”que seja infinito,enquanto dure..”Percebemos que não somos mais obrigados a permanecer num relacionamento que nos torna  infelizes,só para agradar à sociedade ou a família.
Atualmente,o que precisamos fazer,é pontuar as verdades que existem dentro de nós e procurar não nos assustarmos com elas. 
Todos,sem exceção,sonhamos com um casamento eterno.
Ninguém se casa pensando em separação. Busca-se um companheiro que nos acolha,que nos cerque de certezas de vida,que nos aconchegue,nos dê forças quando nos sentimos fragilizados, enfim,alguém em que possamos confiar,acreditar.
Aquele tão sonhado amor avassalador,que nos  arrebata e nos leva ao espaço,o amor utópico,pertence à adolescência.Ele é feito de viagens,projeções,distante da realidade do amor maduro,que é tecido pela cumplicidade,pela troca de olhares ,pela fala silenciosa,pelas afinidades.
Hoje,muitos de nós viemos de outro relacionamento fracassado e cada qual tem suas histórias,seu passado,suas experiências,seus traumas,seus medos..Quando me sento para conversar e ouço as histórias,vejo que é verdadeira a frase que diz :” Na dor,todo mundo é igual”.
A vida, a todo momento nos pede decisões e para todas as ações haverá sempre um reação e por razões que às vezes nos escapam,o outro perde o encanto,muda,parte em busca de outras coisas,ou se fecha,deixamos de sonhar ,um cresce,o outro permanece e ,de repente,um grande vazio se instala .E assim,terminam os sonhos e um relacionamento. Mas,a família nunca acaba. Os filhos,sempre serão filhos .
Nesse ponto nossos avós e pais  erraram,ao firmarem-se na ceretza de que a família é a que mora debaixo do mesmo teto,mesmo sendo infeliz!!!Nós assistimos à evolução dos relacionamentos,vimos mulheres irem à luta,queimarem sutiãs em praça pública em busca de igualdade,mas culpá-las por batalharem por seus sonhos,por tentarem uma vida melhor e mais produtiva do lado de fora do muro,imposto por uma sociedade....Elas apenas queriam ser reconhecidas,valorizadas.
Como disse Lia Luft  numa entrevista:”A mulher aprendeu a gostar de si mesma e a ficar sozinha,sem angústia e sem ansiedade.às vezes,as mulheres mantêm ligações péssimas por medo da solidão.’E então,o que fazer?Devemos ficar nelas,repetindo os mesmos erros de nossos avós e nossos pais ?Nos deparamos ainda com ranços machistas que acham que as mulheres valorizam mais os amigos,o emprego do que a família.Mas,não é verdade. Acredito e admiro muito a mulher atual que vai à luta,e não fica vendo a banda passar,mas está sempre muito antenada,observando o que acontece ao seu redor e no mundo. Essa mulher que sabe amar de verdade e tudo faz para que não sofram as pessoas que ama. Ela tenta solucionar e minimizar os problemas com seu olhar feminino,coisas que passam despercebidas pelo  descuidado  olhar masculino.Não é o dinheiro,nem o status,nem o sobrenome que pesa ,hoje em dia,na escolha do parceiro,porque já sabemos ,bem antes da revista “Caras’ que casamentos assim,só servem para ilustrar capa de revista e se acabam com a mesma rapidez com que começaram.
A grande maioria dos homens modernos entendeu que, educar e orientar os filhos não é tarefa apenas do sexo feminino,mas de um pai responsável,que deseja o melhor para os seus filhos. As tarefas de casa passaram a ser compartilhadas .Embora separados,a família continua,as lacunas devem ser preenchidas por ambos os lados.
Assim,nessa aventura de estar com os filhos, nos finais de semana,quando as empregadas se ausentam,muitos pais enfrentam um fogão,ou um microondas e garantem uma harmonia maior ,mais divertida e mais calorosa.
É uma pena o amor ser tão frágil! 
Ser feliz no amor ,é o sonho de toda mulher.
Mas,uma coisa está bem clara para todos nós;é preciso ter forças para nos reinventarmos todos os dias!
O que não é nada fácil!! Mas jamais dar créditos a um machismo que já caiu por terra , junto com os dinossauros, este machismo sim, nós mulheres extinguimos!!!
A mulher moderna é mãe,é boa esposa,é companheira, é bonita pois se cuida, é bem informada, sabe ouvir e quer ser ouvida, e sendo assim cabe aos homens e mulheres tirarem as máscaras um do outro e assim,viverão mais completos.
Sem fantasias a vida ficará melhor, e todos ganharão com isso!!






Adriane Lima

sexta-feira, 23 de março de 2012

Céu que desaba



Há a tramóia
há o golpe de misericórdia
o que vem da boca para fora
e nos levam à tipóias
de apoio racional

e vai imprimindo viagens
feito ácido lisérgico
morrendo feito um alérgico
que consome a lactose
do leite emocional

há a cicatriz que não some
a dor que consome
e nos traz aos confins

confins das desgraças
das amarguras
das horas paradas e mortas
em que o corpo ganha asas
e os olhos ganham fé

ao olhar a vida
ao que está longe
ao que está perto
apagando o certo
do que confunde
assoprando o anjo

há a negra melancolia
que chega civilizada
senta-se ao lado
traz o pranto e a dor

o amor quando mata nunca morre
e os que morrem nunca matam

doce singularidade
que descobri nesse fim de tarde
onde meu céu se incendiou....



Adriane Lima
 
( Imagem : Jean Paul Avisse )

quinta-feira, 22 de março de 2012

Pássaro Espelho

 
Vem um passarinho me visitar todas as manhãs
mas ele, não vem me ver , nem cantar
vem se admirar no espelho do meu carro
e ali fica horas a bicar o vidro
achando ser outro igual a ele
 
A disputa pelo ego faz ele esquecer o canto
faz ele esquecer sua condição de pássaro
de ser livre de imagens narcísicas
 e levar seu canto sem imaginar onde ele chegará
 
E sem se espelhar em ninguém
ser ele o dono de seu dom
e amaciar os ouvidos egóicos do mundo...
 
 
 
 
Adriane Lima

 
 
 
 
 
 
 Imagem retirada do Google
 
 

 
 
 

Tempo do desassossego



E quando vem elas
não é novela
nem vazamentos
prendem-se choros
umas caladas, 
outras, desaforos

Devagar com o andor
que elas são complicadas
umas se perdem , outras se acham

entre conselhos e presepadas
entre receitas e barcas furadas
entre alecrins e cremes da Lancôme

Estar com elas me dá prazer,
me mostra a vida, não ser insone
estamos mesmo sempre juntas
quando uma está triste, a outra ajuda

Passamos dias de desassossego
entre trabalhos e nostalgias
mas, mulheres, que se prezam
sabem sofrer e rirem logo de alegria

Sentem isso a exaustão,
se descabelam, bebem vinho e
se esquecem na terceira taça 
onde tudo começou a doer

Minhas amigas são minhas guias,
donas de minhas alegrias,  força e fé
são mulheres, loucas,  fortes e destemidas
e se assim não fossem, não daria pé

Uma amizade é intransferível
tem sempre seus coletivos
E eu as assumo em definitivo





Adriane Lima





Arte by Iza Yvanitchenco


quarta-feira, 21 de março de 2012

Amor e Sina


tua ausência
é tão presente que é gente
e me abraça

tua boca
é tão minha
que cala
numa prece

tua presença
coração serenado
em noite escura
onde os silêncios
das tardes são quebrados

teu corpo é templo
é o sagrado
onde escrevo versos
enveredados

e se as pedras quebrassem encantos
se o mar não salgasse meu pranto
eu seria riso, nunca espanto

és a existência da esperança
a crença inevitável no dia que nasce
a fé no milagre renovado na vida
que há em teus olhos e tua alma sentida

és o corpo macio
cais de meu cansaço
templo do prazer
da contemplação
catedral de meus segredos
destino do meu viver

por ti faço promessas
ensaios de grandes orquestras
ode de amor e veneração
por ti os dias são claros
e as noites de lembranças

em ti sou mais
em mim és o bem
amor e sina
ser para sermos
seremos o que convém
 
 
 
 
Adriane Lima  e Orlando Bona Filho

Outono ao teus pés...



Construo-me árvore
os braços a seguir
na direção do sol
ergo-me em busca de ti
pássaro em céu aberto

me mostras minha descrença
e toda diferença
da sede que nos uniu

liberdade
e enraizamento
tentei florir em meu âmago
e depositar cores em tuas mãos
durante o verão
 

sobrevoava em meus galhos
onde nunca fez morada
e lá fora minha solidão
era o tudo, de meu nada
 

sorvendo os dias límpidos
chegou o outono

derrubando as folhas
e em minhas escolhas
despi saudade
me vi tão distante

enraizadas certezas
mimetizaram meu ego
do que não nego
nos teus olhos enxergar

seguindo...
 

vou sendo sombra
sabendo que
vislumbro florestas
além dessas frestas

onde árvore de amor-próprio 
precisarei renascer...

 


Adri Lima






Arte by  Dino Valls 

terça-feira, 20 de março de 2012

De todas as conjugações





Em cada mulher uma verdade
uma vaidade
uma palavra
um paladar

dar-lhe o que
é de direito
se entregar

amar um mar
que existe nelas
abrir janelas
e festejar
 

desesperar-se em verbos
ao conjugar
comer
parir
voar
 

beber a vida
esquecer a morte
se habitar

habituar-se
em ser
em vir
em pousar

meu eu mulher
vai além
do ar
doer
do ir
 

fundir-me
além de ver
tenho o dever
de rasgar o verbo amar
que mora em mim

 

antes de qualquer outro, conjugar...






Adriane Lima








Arte by  Fidel Garcia

segunda-feira, 19 de março de 2012

Borboletas incolores


O amor chegou com o fim de tarde
um céu azul de março
fingindo ser abril
serenando despedidas
acalmando meu peito febril

O medo fez parte
das nuvens carregadas
que visitavam minhas vontades
e seguiram leves
sem formar tempestades

é bem verdade...
eu abri espaços
para o amor chegar
e tive medo de amar

veredas, vontades
gavetas da vida
levando nos guardados
um gosto de maçã
do beijo roubado e da despedida
infância renasce
amor, pureza
o salto, a incerteza
onde busquei afinidades

esquinas em branco
por ti dobraria
prefácio ou capítulo
não sei
seguirei escrevendo

borboleta em minhas mãos
mudou de cor
e em meu imaginário
se incorporou ao infinito

 
Adriane  Lima




Arte by  Ekaterina Panikova

quinta-feira, 15 de março de 2012

Cisma







Brinco com cores
o dia inteiro
e ás vezes
cismo
que o azul é
meu abismo

 


Adriane Lima






Arte by  Itália Ruotondo

Cisma







Brinco com cores
o dia inteiro
e ás vezes
cismo
que o azul é
meu abismo

 


Adriane Lima






Arte by  Itália Ruotondo

Cisma







Brinco com cores
o dia inteiro
e ás vezes
cismo
que o azul é
meu abismo

 


Adriane Lima






Arte by  Itália Ruotondo

Sedução

 
 
No eterno jogo de sedução
um dia acaba a ação
fica a sede...


Adri Lima
 
 
 
Arte by Paul Bond

Crônica:"Pobre de mim que casei com a arte"...






Antes de julgar a minha vida ou o meu caráter... calce os meus sapatos e percorra o caminho que eu percorri, viva as minhas tristezas, as minhas dúvidas e as minhas alegrias. Percorra os anos que eu percorri, tropece onde eu tropecei e levante-se assim como eu fiz. E então, só aí poderás julgar. Cada um tem a sua própria história. Não compare a sua vida com a dos outros. Você não sabe como foi o caminho que eles tiveram que trilhar na vida.

Clarice Lispector



Sempre ela,acho que muito do que ela escreveu me cabe feito luva,admiro demais a forma como Clarice soube viver entre o que tinha interno e o externo,mesmo que isso lhe custasse dias de depressão e angústia.
Mas, ai me pergunto quem não os tem nos dias de hoje???
Onde vivemos cercados de olhos que nos vigiam em redes sociais,olhos que nos julgam até por uma frase que postamos,e assim como um livro vamos sendo lidos,uns apenas olham a capa e já dizem se gostam ou não,outros mais curiosos vão ao conteúdo,ai esses sim tem o direito de falar se gostam ou não do que viram !!!!
Tem dias que fico inquieta,tenho tantos pensamentos para poemas, crônicas,contos,mas, nada quer vir parar no papel.
Deve ser porque o que consegue sair , fica trabalhado, já está "elaborado" como diriam os psicólogos.
Mas nem tudo que escrevo está elaborado dentro de mim de forma que não tenha me pesado,me feito sofrer ao lidar com esse olhar sobre o meu interno.
Não é fácil viver sobre o olhar do outro, o olhar inquisitor, julgador que a maioria coloca sobre nós.
A gente sempre exige das pessoas que ama e elas também tem esse direito sobre nós, porque à partir da indiferença vem também a descrença de que podemos mudar e melhorar.
Mas, nem sempre o que é a minha verdade ,é a verdade do outro,mesmo que ele esteja próximo a mim, a leitura interna é minha,e mesmo porque as verdades mudam e a cada dia mais me convenço disso.
O olhar que tenho sobre determinada situação não pode ser linear,não posso ser dono de verdades absolutas até mesmo porque elas não existem e isso já coube até a filosofia descrever.
Mas, me pego sempre sob a ótica de meu filho,que cobra de mim um trabalho,que eu saia de casa,volte a exercer uma profissão.
Imagine o quanto é contraditório.... ele faz faculdade de Economia e eu vivo hoje em dia da Arte.
Olhares dilacerantes entre o racional e o emocional.
Mas, eu sei os valores culturais que também ensinei a ele e por mais que ele tenha um mundo capitalista ao seu redor,ele tem também refinamentos internos para apreciar o belo, o simples, o que vem da alma e então nossas discussões são também digressões sobre a vida !!!
O que acho saudável, porque assim um, não inibe o outro em suas escolhas pessoais.
E se isso acontecesse geraria entre nós uma incomunicabilidade terrível e graças a Deus não é o que acontece!!!
Mas, vez ou outra não nego me incomoda ve-lo entrar aqui e falar: -mãe você precisa trabalhar!!!!!
Isso porque ele chega, estou de tintas até os cabelos,dentro de meu atêlie (seu antigo quarto,por sinal) que hoje tem mesas, armários ,estantes lotadas de tintas,apetrechos como ;pincéis,madeiras,telas e uma parede colorida que eu mesma fiz,enchendo de mandalas e borboletas!!!
Pois bem, ele acha que trabalhar não é acordar as seis da manhã,organizar a casa antes de mais nada,por roupas para lavar,limpar a sujeira dos cães,organizar a bagunça deixada na noite anterior sobre a pia, e ai sim,começar as minhas artes.
Ai vem,dar uma demão de branco,ir para o quintal e lixar,lixar,lixar até que tudo fique liso e pronto para receber a arte.
E essa tem que vir da criatividade,do bom gosto,do meu olhar sobre os materiais que tenho em mãos na hora e fazer algo que não tenha por ai pois, odeio cópias!!!
Eu tento não fazer caixas, tento fazer .."ARTE" nas minhas peças.
Se fosse para ser algo que tem por ai nem perderia tempo e iria sim, procurar um emprego numa loja, numa fábrica,numa empresa.
Porque existe sim uma grande diferença entre se ter um emprego e se ter um trabalho.
Eu tenho por profissão a  fonoaudiologia,sempre fui autônoma,tendo meus horários mais flexíveis e portanto nunca tive um emprego com hora de bater cartão,cumprir metas e sair.
Fiz de minha profissão um sonho, estudava muito, lia, pesquisava,estava muitas vezes à frente de muitos médicos de minha cidade mas, era incrível ver as mães chegarem e falarem que o Dr.pediu para esperar que um dia a criança iria falar,iria pronunciar o "R" ...e olha que muitas já tinham quatro anos...e assim fui desistindo dessa profissão e assim lá se vão, mil casos que prefiro guardar a sete chaves,porque ter um título não quer dizer gostar do que faz e fazer por amor...aqui cito de novo a arte.
Porque toda e qualquer profissão precisa ser exercida com arte e amor,senão vira mecanicista,perde o humanismo da situação e esse sempre foi meu foco de atuação.
Mas, os médicos sabem mais que os terapêutas,assim como muitos filhos hoje sabem mais que os pais...estamos quase lá no:Quem nasceu primeiro,o ovo ou a galinha!!!!
E foi assim que comecei a me desapegar de minha profissão.Porque a arte, ela nasce com a gente que é sensível,quase que dê berço.
E quando me vi no meio das tintas, me soltando,criando,escrevendo eu me vi viva, inteira,verdadeira!!!
A arte literalmente me deu "asas de borboleta",sai desse casulo que muitos chamam de zona de conforto.
Abandonei sim tudo,não digo que é fácil ficar em casa trancada,muitas vezes descalça,cheia de tintas,cabelo num rabo de cavalo,unhas sem pintar,rezando nem para o porteiro nos ver!!!
Mas em compensação ganhei o canto dos pássaros que me visitam o dia todo no quintal enquento lixo as caixas,um pôr do sol lindo da janela enquanto pinto num fim de tarde, a música que me acompanha o dia inteiro onde viajo e deixo a inspiração me conduzir.
Ganhei ares de liberdade em minhas escolhas,eu que sempre tive um espírito livre acho que agora faço ele ainda mais feliz!!!
Na vida não temos respostas para o que nos basta, o que nos cabe,a cho que estou vivendo uma plenitude muito grande, o silêncio dos dias me fazem pensar na vida, me fazem ter a certeza de que não precisamos muito para sermos felizes!!!!
E muito menos deixar que nos convençam de que o mundo lá fora é somente capitalista,quando estamos casados com a arte,com a poesia que não enche barriga mas, inunda a alma.
Não quero ser mártir ,nem brincar de sair pelo mundo pregando que na vida vale somente as escolhas.
Porque a vida também nos esfola pelas nossas escolhas. Mas o olhar que pesa do outro dói muito mais.
E nossas crenças podem mudar sempre, depois que algo nos fere, nos tira do chão,nos impõe situações avessas tipo um caso de morte,uma doença terminal,uma perda do ser amado,ou mesmo uma perda material.
Ninguém gosta de ser julgado,ser questionado,ser tido como louco por não pertencer a uma maioria que se prendeu a rituais de trabalho e sabe que não é feliz assim mas, precisa ter para ser.... e não ser..para ter!!!
Por isso não gosto e nem julgo a vida de ninguém,vejo sim, pessoas vivendo de forma errada, distorcendo situações,
sendo amargas,críticas,infelizes e mesmo assim, não se lançam as mudanças, não se dão direito a novos ares, nessas situações julgar não é meu caminho,apenas, me lamento por elas.
Lembrei agora de uma frase da Elis Regina que diz assim: "Tenho o prazer de me danar e me recompor sozinha.Não preciso de muletas."
Taí, uma frase que assinaria hoje em baixo...opreço a pagar??
....Ainda não sei, quem sabe precise de um empréstimo mas, não de dinheiro e sim de emoções reais,que essas sim nunca são demais!!!!
Sei que pode parecer pesado,mas filho depois de uma de nossas conversas,escrevi isso aqui para você:


Hei filho,quisera eu que você voltasse  para teu berço onde as grades te protegiam das inverdades desse mundo imundo.
Hei filho, já não posso mais te embalar em meus braços como fazia, por noites a fio até você adormecer.
Hei filho,o mundo é esse: é pagar para viver ou viver para pagar,é entrar nessa ciranda que talvez não tenha te ensinado a dançar!!!
Hei filho, essa sou eu: a poeta,a sensível,a artista, a que não nasceu para o mundo "business", mas que sem a arte,a imaginação, a escrita que nasce em mim todos os dias ,essa eu não saberia mais viver.
Hei filho, essa sou eu a mãe que e te ama loucamente deste o dia que te viu sair de dentro dela!!!!
As mães são sempre erradas ,chatas,delirantes, até o dia que nos tormamos mães também....puts,isso é profético ,vai por mim!!!

E novamente citaria Clarice Lispector para encerrar esse texto :"Sou o que quero ser, porque possuo apenas uma vida e nela só tenho uma chance de fazer o que quero.Tenho felicidade o bastante para fazê-la doce, dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana e esperança suficiente para fazê-la feliz.
As pessoas mais felizes não tem as melhores coisas,elas sabem fazer o melhor das oportunidades que aparecem em seus caminhos."
Obrigada filho, por me ensinar a ver o mundo com amor, com preocupação,por saber que você quer o melhor para mim mas, que nossos "olhares" nem sempre estão afiados!!!

Beijos filho amado,durma bem...eu estou bem e trabalhando bastante !!!!

Adri Lima





( Imagem: Ekaterina Panikanova )

quarta-feira, 14 de março de 2012

Corpo poético

Acordar...
a cor dar
dois verbos
prontos para iniciar
o que ela estava disposta
a revelar...
rever lar
onde se vive
onde se quer estar

ela penteou os cabelos
vestiu um vestido preto

por fora um sorriso ameno
por dentro uma dor alegre
e assim corpo e sorriso
se acomodaram no vestido
ambos vestidos por ela

e dentro dessa solidão de corpos
a ausência ocupava o espaço
e ela se pôs a andar pela casa

acordar e dar a cor
é só o que importa quando o corpo
já virou poesia


Adriane Lima 



Arte by Joanna Zjawinska

Entre_telas


 
Todo mundo anda moderno
todo mundo anda antigo
todo mundo quer amor
todo mundo quer abrigo 
todo mundo desanima
todo mundo perde a rima
todo mundo tem luz
todo mundo tem sua cruz
todo mundo já foi ferido
todo mundo sofreu castigo
todo mundo correu perigo
todo mundo tem um nome
todo mundo sabe quem é
todo mundo só não sabe
se vale vir o que vier 
de destino ao desatino
todo mundo já foi menino
e já amou uma mulher...
e quem se enganou a tal ponto
deve sangrar na certeza
de ser mesmo verdade,
que as mulheres são de Vênus
e os homens são de Marte...

 
Adriane  Lima
 
( Imagem : Karol Bak )
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