" Haverá um ano em que haverá um mês, em
que haverá uma semana
em que haverá um dia em que haverá uma
hora em que haverá um minuto
em que haverá um segundo e dentro do
segundo haverá o não-tempo
sagrado da morte
transfigurada."
Clarice
Lispector
Desde que começo a pensar em minha existência, me debato
entre um ser filosófico, questionador e um ser que pulsa em sensibilidade
pueril.
Por mais que seja comum, para mim esse olhar sempre tão
humano que possuo, recaí sobre os instintos que vejo, em algumas pessoas que me
cercam.
Isto me remete as tão belas palavras de Nietzsche :"
Quanto de verdade suporta,quanto de verdade ousa, um espírito" ??
Hoje essa foi a profunda reflexão desse mundo efêmero e
enganador dos vivos sob os quais ainda consigo extrair levezas, que me fez
sentar e escrever .
Ao retirar o pó da estante de alguns livros, me deparei
com o então amarelado, Trópico de Câncer de Henry Miller e pensei : que tola
fui, em não tê-lo terminado. Que tola fui em ocupar-me
com tolices,essa total insensatez de crer no tempo e
suas infinitudes.
Talvez na época estivesse imatura para tal leitura mas,
assim como um rio que flui, a vida também tem seu curso fixo.Quiçá,seja agora a hora de terminá-lo.
Penso agora no humano e suas ideias de seu precioso
tempo. O chronos demarcado pelo finito e por que não
dizer lenitivo ponteiro.
Paga-se caro pelas contingências e tão pouco pela
existência,fato esse ligado aos sentimentos e sua origem
nos juízos.
A vida mostra-se como um palco giratório, que permite ao
espectador entrever suas fases de conflito.
E foi assim que diante de meus olhos,nascia uma nova luz,
um brilho vindo de minhas vivências, dessas que com nossas artimanhas,
engavetamos
para não macular o lado virgem da alma ao nos julgarmos
menos neurótico que os demais !
Preferi me achar insignificante,e assim socraticamente
falando, compreender que não compreendi muitas coisas que vivi.
Erramos e perdemos o visceral e lúdico quando colocamos a
razão em choque com a emoção.
Sei que, sentir é estranho, é uma necessidade vital e
quando mergulhamos no que fazemos, nos enchemos de questionamentos e na maldita
dialética.
Será que o outro pensou como eu, em determinada situaçâo?
Será que o outro sentiu como eu ?
Claro que não, sentir é interno e quantas situações
semelhantes precisamos viver para descobrir que as sensações são muito
diferentes.
Sei que aparento ser uma eterna contradição e por tal, me
acho sábia.Pouco me revelo aos que me veem com suas
certezas absolutas apesar de verborrágica sou altamente observadora,
sou dramática e apaixonada como
as mulheres dos filmes franceses, altamente desproposital feito Anna Karenina,
em sua roupagem amorosa e feminina, ora intensa, ora infantil ,sou desprovida de
eruditismo seletivo mas, me perco entre discursos filosóficos costurando-os à
retórica para ironizar e brindar entre risos com aqueles
que dividem comigo o meu melhor. Vivo intensamente de emoções e não de paisagens.
E isto aprendi com a vida e não nos filmes ou na
literatura que sempre me acompanharam.
Outra inferência à minha tolice, óbvio !!!
Vinda da crença que muitos que me amaram, não passaram do
terreno do mito.
Os belos impulsos do corpo e da alma permeados pela
maleabilidade das palavras e gestos amorosos.(até onde
verdadeiros?).
Realmente, hoje resolvi dissecar a carne, o âmago e
amenizar a fome e dissolver verdades em seu autêntico estado bruto.
Tolice... bem sei.Dentre tantas
tolices que me permiti viver hoje, uma delas foi sair caminhando a esmo, como
uma estrangeira, pois, não deixo de ser.
Moro nesta casa há sete anos e nunca havia me permitido
olhar a paineira intensamente florida e me dar conta do quanto sua flor é
perfeita e tão efêmera.
Aquele vermelho intenso logo se transformará em uma paina
branca soprada pelo vento.
Impossível não ter olhos para esse essencial da vida, é
preciso ter olhos de repouso para se educar a alma.
Há um traço de dor em viver meu hoje, embora minha
condição humana possa admirar fauna e flora e saber interpretá-las mais que a
maioria da raça humana.
Em meu instinto falho, ao supor interpretações de
sorrisos, gestos, convites, vícios e desejos.
Ah, mundana forma de se encontrar com o paradoxal que nos
engole nesse velho hábito que nos anestesia.
É esse vazio da espécie que me incomoda e não me
acomoda. Eu olho ao meu redor e resignifico minhas
escolhas.
As flores seguem seus impulsos de flores, brotam,
enfeitam, perfumam e morrem.
Animais seguem seus instintos, nascem, caçam, acasalam e
morrem.
Alguns condicionamentos aprendidos ao cativo humano os
transformam e nem por isso há menos beleza.
Quem convive com animais e flores acaba tendo esse olhar
de distanciamento ao ser humano, que se encontra tão
cheio de roupagem e não percebe que a palavra "vida" os
desejaria nus.
A impessoalidade me causa arrepios, a soberba
náuseas. Não sei mais o quanto de honestidade há em mãos
humanas estendidas e na ternura de suas vozes.
As relações perderam-se no poder dessa dialética concebida
e pouco usada.Essa foi a grande punhalada em minha
credibilidade durante uma vida inteira.
Eu absorvo o sentido da paisagem enquanto vejo muitos,
somente fazendo parte dela.
Viver dói e, essa sinceridade vem sempre de alguém que
sente e sofre confessa, Minha dor não é secreta, trago isso em meus
olhos.
O meu espírito livre muitas vezes me escravizou.
E foi na escrita que pensei que poderia encontrar tal liberdade.
Me afastar dessa fogueira diária e me queimar em palavras
poéticas, mergulhando em confissões anárquicas
entre o que se vive, se vê e se imagina ou
imaginam.
Como escrevi há pouco tempo no poema que intitulei "
Plêiade Mágica" assim são os poetas, um clã de magos,semideuses e devoradores de
sonhos.
Vestidos de quimeras e doridos em cicatrizes,
potencializam emoções para pulsarem no simbólico.
Mas, escrever dói mais do que viver.Enquanto escrevo
internalizo ainda mais a minha vida.
Talvez escrever seja pedir perdão a todas as ações que não
pratiquei e a tudo que deixei amarelar.
Como esse livro encontrado hoje em minha
estante.
Adriane Lima
Arte bu Amy Judd
Nenhum comentário:
Postar um comentário