quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Na crisálida de palavras



Entre meus dias monossilábicos
aparece você
dona de meus acordes
e risos dissonantes

ali um silêncio de nuvem
compõe a paisagem
quando olho para o relógio
e sei que o tempo
é curto para nossos assuntos
a seifar urgências
no calendário dos sonhos

sou toda palavra
a folhear histórias
que estavam guardadas em mim
em você e em todas as ruas do bairro

somos enfim barulho de trem manso
saindo da plataforma
e seguindo os percursos e percalços
da vida que grita por nós









Adriane Lima










Arte by Christian Chapman

Vertigens do tempo



Sinto na alma
a falta de sua carne
a mesma que adentrou a asa
mordeu o poema

e cuspiu letras
sob meu corpo queimado de sol

adestro cada silêncio
murmuro algumas canções
antes de dormir
e sonho

com seus olhos miúdos
pela dor e cansaço
dos dias escuros





Adriane Lima





Arte by Peter Seminck

Poema existencial



E eu ali inerte
a olhar a parede que descasca
o mato de cresce absurdamente
as telhas que mofam com as chuvas
o armário cheio de roupas que não servem

e eu ali inerte
a olhar as teias de aranha pelos cantos
as cartas de amor amareladas
as fotos até então guardadas

e eu ali inerte
a olhar as rachaduras sob a escada
a champanhe que aguarda o melhor momento
o espelho que compõe tantos silêncios

e eu ali inerte
tomada por pensamentos inéditos
e desejos de ver o mar






















Adriane Lima










Arte by Barney Corteau




O pendular de átomos



A tempestade
me traz uma lágrima
depois outra e
uma infinidade delas

a dor de sentir dor
e não poder gritar
remoer âmago
atiçar os poros
e se abraçar

ali, em plena
solidão de dor

dor de ser sentida
mais que minha
essa que caminha
pelas pálpebras
desce a coluna
e meu lado humano
se esvazia

dor de muitas almas
em um só corpo
dor indissolúvel
que afere à morte

dor
de ser sozinha
nesse braço de mundo










Adriane Lima










Arte by Christian Shloe
















Um lugar para se chegar



A madrugada
não mais me afaga
não me veste
com suas cores de breu
e brilho de estrelas

a madrugada
não é fria nem quente
pura mornidão
onde a ausência
tange meu corpo

a madrugada
me faz aclamar
por um lugar de chegada
uma réstia de luz
uma voz acordada

só assim sinto
que estou viva




Adriane Lima






Arte by Tomasz Alen Kopera

Beber os silêncios



Os silêncios de pedra
soterram aqueles que amo
acabe-me na fragilidade de vidro
a intempérie desmedida
em cacos
rumino tudo, lentamente






Adriane Lima





Arte by Ivana Besevic
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