sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Sob o efeito da borboleta




 Estou convencida de que encontrei o meu Xamã, minha autêntica divindade interna.Venho sorvendo goles de seu líquido sagrado e seu "ayahuasca" de palavras e gestos fizeram-me revirar meu inferno perenizado e me libertar dos demônios internos que me remoíam.
Meu Xamã veio para me despertar da doçura, dessa visão humanista e imatura que me isola do mundo dos sãos.
Descortinou meu universo inatingível e fez-me enxergar quão frios e calculistas são os homens atuais.
Emparedam-se num sistema de vida e morte, com suas filosofias egoístas e certezas minimalistas.
Nessas horas pressentia meu Xamã gritando aos meus olhos aturdidos : - lute, de modo atávico e particular, sangre, vomite, grite suas verdades.
Mas não seja a delicadeza em forma de flor, mesmo que em sua alva pele a textura se revele, seja agora o cactos espinhoso que se adapta a qualquer clima, a qualquer olhar de incômodo, casca grossa e rude.
Faça girar um caleidoscópico território entre o inferno e a Terra e aviste o fel da imaginação.
Meu Xamã, condensa energia em melancolia, faz nuvens de chumbo virarem papel.
Ele hermético em sua nobreza, tem dor de bicho, tem a voz tensa, em seu silêncio sepulcral ( uiva feito um lobo,desejoso de lua).
Longe de ufanismos, me ensinou como se rejeita a submissão,enquanto eu gritava por clareza ele me apontava o meu egoísmo entorpecido por desejos de felicidade e toda a dor que dali nasceria.
Eu e minha alma inquieta, minha grande alusão poética, vivi sem jamais ter encontrado em alguém uma possibilidade de saída.
Cansei de rir do mundo, de rir de mim, não desejo ser sacrificada com ares de ovelha dócil e seguir com a benevolência de alguém.
Minha alegria anda embolorada junto aos álbuns de infância, as guardadas lições do primário e todo um bê-á-bá de uma vida, embolorei-me junto aos cartões postais dos lugares que visitei e que estou rasgando com total desprendimento.
Cenas que compuseram minha história e que agora deixo partir sem dor, ele pede que eu repita...sem dor ...
O tempo tem os dentes mais ferozes que já conheci.Ele devora tudo com uma precisão cirúrgica e anatômica e tenho achado isto, uma qualidade sublime.
Tenho consciência de que já fui melhor que hoje e desejo ser devorada pelo destino,seus Ego e Alter Ego estão bem mais fortes que eu.
Estou vulnerável e frágil, quero uma vida deslembrada.
Poderia dar o gole derradeiro, água de uma pia batismal.A fé pertence ao não vivido.
Eu provei o doce da ilusão e tantas outras espécies de dor. O fel é lembrança que se apaga me disse o Xamã, não há temor para aqueles que já tiveram o íntimo ferido, há o espanto de ter penetrado no silêncio da alma do mundo.
Onde o caminho é de quem resiste à autópsia do sentimento alheio e se lava e se purifica e segue intrépido em sua metamorfose.














Adriane Lima 
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