quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018
Água de calmaria
Desenho para ontem, um mar
já que não posso senti-lo
em meu corpo
ondas intensas no olhar
uma profunda vastidão
margeiam o peito
é sempre inútil sonhar
com o inexorável passar do tempo
o mar a espera dos rios
que cortejam sua beleza
minha rugas, são rios
de passagens
retendo areias e melancolias
o que está distante
são símbolos que aprendo
decifrar
o que minhas mãos
mostram em conchas
reverberam saudade
Adriane Lima
Arte by Danielli Richards
Colado aos olhos
Enquanto escrevo,
a vida se transforma
a madeira arqueja
o homem envelhece
a nesga dobra o passível
os espelhos se desgastam
o trigo amadurece
o algodão floresce
os caprichos se esquecem
alguém entra pela porta
outra sai do peito, já morta
a vida segue seu percurso
nas escolhas ou nas surpresas
o vento mantém o ar em movimento
meus gatos se fecham em proteção
a solidão faz parte da paisagem
enquanto o animal adormece sem medo
vagueio nos cantos da memória
a buscar palavras para compor o que sinto
enquanto escrevo,
mais um dia se vai
transforma-se na imagem do que
desperdicei ou na história
indecifrável, que inventei viver
enquanto escrevo,
o que retalho se acalma dentro
onde toda ausência vira palavra
e ganha vida em minha frente
Adriane Lima
Arte by Alexi Torres
O silêncio que comigo fala
à flor da carne
entre olhos de silício
que embaçam a visão dos dias
meu poema vem dos rios
e dos risos, em tarde desperdiçada
interpelando a paz contida
vazada em silêncios e
intensidade
faço poemas contra o tempo
decifrando meus desertos
brindando as gotas de chuva
ou as estrelas do ocaso
nada corrói o meu poema
nem as traças das palavras rebuscadas
ou a unicidade harmônica o mundo
onde o dizer e não dizer nada
é a força que compõe o mistério
são descompassos internos
nos fios esparsos dos dias
lavando o pó da alma
Adriane Lima
Arte by Aykut Aydogdu
quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018
Onde olhos habitam asas
Embriago-me do temporal
do dia de sol, em meu quintal
embriago-me lendo Vinícius,
ou assistindo um filme
que me faça chorar
Embriago-me ao pensar na ciência,
na evolução do homem e sua fé
quando leio conceitos verdadeiros
e sentimentos sem manipulação
Embriago-me na ternura de meus gatos
e na sordidez humana que vejo
quando ouço mentiras e apelos
com sua psicopatia tão bem estruturada
Embriago-me por todo olhar infantil,
sem maquiagem ou coisa que valha
através de minhas dores ou universais
vindas da miséria ou pura ganância
Embriago-me do mais puro vinho
dos deuses esquecidos,
pela profanação e calúnia desde que,
o mundo é mundo
Embriagando-me e vejo a vida
com olhos de quem usa a espreita
para sobrevoar acima dos abutres
Adriane Lima
Arte by Marina Podgaevskaja
Embriago-me ao pensar na ciência,
na evolução do homem e sua fé
quando leio conceitos verdadeiros
e sentimentos sem manipulação
Embriago-me na ternura de meus gatos
e na sordidez humana que vejo
quando ouço mentiras e apelos
com sua psicopatia tão bem estruturada
Embriago-me por todo olhar infantil,
sem maquiagem ou coisa que valha
através de minhas dores ou universais
vindas da miséria ou pura ganância
Embriago-me do mais puro vinho
dos deuses esquecidos,
pela profanação e calúnia desde que,
o mundo é mundo
Embriagando-me e vejo a vida
com olhos de quem usa a espreita
para sobrevoar acima dos abutres
Adriane Lima
Arte by Marina Podgaevskaja
terça-feira, 13 de fevereiro de 2018
Água viva
Cansa-me fingir figurante
nessa história toda, onde
sei, que sou a protagonista
mudo o enredo, saio de cena
faço tipo quando quero
Tão ingênuo quem acha
o contrário
pelo simples fato
de pagar caro
e de otário
Adriane Lima
Arte by Gustavo Fernandez
de pagar caro
e de otário
Adriane Lima
Arte by Gustavo Fernandez
Sobre aforismos
Quando o que sei
esbarra no que finjo que não sei
abro o sorriso mais escancarado que posso
é de lei fazer cara de paisagem
pra os que ainda abstraem
o que já sei concreto
Adriane Lima
Arte by Michael Cheval
Adriane Lima
Arte by Michael Cheval
Daquilo que eu sei
Eu quase achei que você viria
pela sua implícita covardia
pelo o que vem sempre como as
primeiras palavras ao romper o dia
Eu quase achei que você seria
o impulso nato, diante da alegria
pelo que senti e há tempos não vivia
últimas palavras frente ao meu riso frouxo
Essas tão meias verdades usuais de agora
o olhar que desvia nessas tolas horas
o cansaço imenso tamanha a falsidade
do fruto podre na mais tenra idade
Não sabemos nada de onde se perdeu
a melhor saída no silêncio das esquinas
uma saliva abocanhada, entre o quase nada
os resquícios da memória da dor racional
de saber que a história, nunca terá final
Adriane Lima
Arte by Brian Viveiros
sábado, 10 de fevereiro de 2018
Espaços em branco
Hoje o silêncio é tudo
na liquidez do dia,
a casa, como companhia
o agora, é tudo que resta
do vazio profundo
os passos trocados
à procura do viés
da vida
os caminhos sem saída
a íntima falta
até então, negada
hoje, o sonho extinto
no peito livre que diz,
desconhecer o amor
as úmidas horas
da chuva que cai
aconchega a ilusão
são tempos voláteis
para quem brincou
de viver, fingindo não conhecer
os ritos
Adriane Lima
Arte by Fernando Ortega
Adriane Lima
Arte by Fernando Ortega
Silêncio fabricado
Pedi para você despertar
na calada da noite
é de sina, é de sorte
ouvir o murmúrio do ar
são gatos no cio
o vento que sopra
sobre o vazio, da estrela cadente
é o ritmo imponente,
da escuridão
são rastros do infinito
animais de instinto
que velam o sono
e conhecem todas fragilidades
enquanto o dia nasce
e faz com que a alma
mergulhe sem entender,
quando tudo irá cessar
Adriane Lima
Arte by Alessia Ianetti
Tempo de palavras
Guardei por tempos algumas palavras
amarrei uma por uma, feito colar de contas
enfeitando minha garganta
palavras ali depositadas
organizariam pensamentos e
não pousariam em folhas brancas
nem abririam como pétalas,
exalando perfumes de bem ou mal querer
seriam apenas palavras
caladas, úmidas e equivocadas
entre pensamento e linguagem
para a aragem não subiriam
feito bolhas de sabão e portanto
não cairiam em mãos erradas
então calei dias e noites meus versos,
mesmo sabendo, estarem aqui dentro
aguardando minha hora
de jogar com o nada
de suspirar em alívio
por ser eu mesma meu bumerangue
seriam apenas palavras
caladas, úmidas e equivocadas
entre pensamento e linguagem
para a aragem não subiriam
feito bolhas de sabão e portanto
não cairiam em mãos erradas
então calei dias e noites meus versos,
mesmo sabendo, estarem aqui dentro
aguardando minha hora
de jogar com o nada
de suspirar em alívio
por ser eu mesma meu bumerangue
das palavras que sufoquei internamente
só encontro PAZ nesse silêncio
ao compreender que tudo é impermanente:
o passar dos dias
todo sentimento do mundo
e minha verdadeira voz
Adriane Lima
Arte by Agnieszka Wencka
só encontro PAZ nesse silêncio
ao compreender que tudo é impermanente:
o passar dos dias
todo sentimento do mundo
e minha verdadeira voz
Adriane Lima
Arte by Agnieszka Wencka
Folhas mortas
O leve ultimatum
do último gole
do último desejo
da última cena
do que poderia ser dito
o pesado ultimatum
do último beijo
do último adeus
da última visão
do que poderia ter sido
aquilo que resta
in memoriam
para o resto
da vida
do verso
do rés
da dor
tão gente
tão cão
que torna
o sentir
o fardo da vida
Adriane Lima
Arte by Xavier Pesme
tão gente
tão cão
que torna
o sentir
o fardo da vida
Adriane Lima
Arte by Xavier Pesme
Mil rotas
O silêncio do dia
faz o poeta ver poesia
até onde não há
Na cabeça mil pensamentos
no peito seus tormentos
que ele deseja gritar
A razão pede socorro
pede para o peito acalmar
e o poeta quer ser ouvido
ver sangrado os sentidos
para o impulso de se soltar
A irreverência do que guarda
se contrai e se expande
e num piscar de olhos
o poeta muda de foco
É de brincar de sí mesmo
que no fundo ele gosta
para se mutilar em tantos
se esconder e se encontrar
no barulho da noite
Adriane Lima
Arte by Cátia Creole
sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018
Tempo de sobrevivência
É quando se caminha
ferida entre tantas batalhas
que insistimos em achar alguém
que valha, cada sorriso,
cada estampido dos nãos
ecoando ainda em pretéritos
as mãos estendidas não
entendem mentiras
sorve a porção oculta
por simples sobrevivência
a pele, a alma, o ar trocado
são ardências e memória
hoje o dedo escorre
em tela plana e recorre
na ânsia de acreditar
que ali, entre nomes
haverá algum a se salvar
Adriane Lima
Arte by Sandra Chevrier
Há mares
eu nunca havia feito a analogia:
Eu, você
toda essa imensidão.
Décadas a nos separar
salinidade, beleza sem nexo
pelo tempo que foi perdido
salinidade, beleza sem nexo
pelo tempo que foi perdido
Eu e você
conchas de proteção
por tudo que foi sentido
Eu e você
estranha eternidade do que amamos e foi destruído
Adriane Lima
conchas de proteção
por tudo que foi sentido
Eu e você
estranha eternidade do que amamos e foi destruído
Adriane Lima
Arte by Alberto Tamburo
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