segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Raízes aéreas





Não foi a flor
foram as raízes
cresceram além do vaso

pouco espaço
para anos de existência

por espanto
tapei cicatrizes

me disseram:
- logo saram

e assim foi fácil,
joguei grama em cima

tapei o buraco

como reticências
o vazio deixou recados

o mundo é assim
perante olhos vagos

a dura cerâmica
neste dia que virou caco



Adriane  Lima





Arte by Catrin Welz Stein

Amor sem escalas






E no princípio
era o sonho
o pássaro a rondar
o pouso
pregado a eternidade
de voo

e no principio
era o medo
a moça a adiar
o voo
sonhando a eternidade
de pouso

 


Adriane Lima





Arte by Etsy 

Nuas ramagens


 
 
 
Tudo começa com um sim
a vida e o universo
as intenções e os versos
 
a tua história e a minha
os monstros do pensamento
 
na saciedade da ilusão
a claridade e o escuro
das alegrias do coração
 
quem está vivo diz sim
muitas vezes querendo
dizer não
 
Uma armadilha
são os dois juntos
como um murmúrio
que não aprendeu a gritar
 
na carne há um sim
na divindade, não sei
 
o que se esperar enfim,
no desvelo de dois caminhos
regados a tantas incertezas
entre grades de proteção
 
por temer-se passarinho

 







Adriane Lima 



Arte by Igor Zenin

Um leve acaso

 
 
 
 
Existi em teus beijos
estrelas marinhas
em úmidas retinas
 
existi em lampejos
entre luz e escuridão
de olhos bêbados
 
a imagem é lembrança
que a impossibilidade
foi apagando do olhar
 
me veio o estranhamento
de aceitar a narrativa :
 
- tudo o que é sólido
se desmancha no ar
 
 
 
 
Adriane Lima
 
 
 
Arte retirada da net

sábado, 26 de outubro de 2013

Lua lagrimogênica

 
 
Sou caminhante
sigo em meu papel de aprendiz
e no ritmo presente
observo por onde me conduzi
em algum lugar do universo
em alguma novidade no olhar
em alguma tentativa de verso
em algum cheiro familiar
em algum sabor de fruta
em alguma flor abrindo
em algum pássaro livre
em alguma manhã azul
em algum entardecer laranja
em alguma foto envelhecida
em alguma cadeira vazia
em algum tapete felpudo
em alguma mesa florida
em alguma chama acesa
em algum barulho de chuva
em alguma aeronave rasgando o céu
em alguma mão acenando
em alguma porta abrindo
em alguma palavra faltando
em algum filme romântico
em algum tango de Gardel
em alguma noite mal dormida
em alguma promessa de viagem
em alguma música esquecida
em alguma nova imagem
em alguma gargalhada alta
em algum olhar que falta
a memória guardará a vida que se foi
dispensando a lua dos retratos

 
 
 
Adriane Lima
 
 
 
 
Arte by Jimmy Lawlor 

Entre opostos sincopados





Tem dias que sou
a estranha mais estranha
não tenho fome
e me sirvo
não tenho voz
e me grito
amo quem desconhece o amor
e expurgo quem o zela
e cuido de minha dor
como se fosse outra
me dou água
e não tréguas
não me ouço
me digo adeus
e me dou colo
é estranho viver assim
nesse eterno jogo
de esconde-esconde
e onde mais
me reconheço
é feito um frágil passarinho
dentro do ninho
em plena solidão de peixes





Adriane Lima










Arte by  Genesine Marwendel

Estrela da sagração matinal






Adormecida em plena essência
sensível ao menor toque
olhava o corpo em sua frente
em êxtase de sonhos florescentes
 

o corpo em seu todo imaculado
entregue a luz que o iluminava
adormecia a princesa de outras eras
na ânsia de um futuro a sua espera

ao ver sua alma assim desnuda
reconfortando-se em úteros marinhos
pode conter a fúria de toda eternidade

os poemas desaguavam em pleno leito
escondidos atrás do tempo perdido
as palavras se formavam pelos beijos
e assumiam o corpo em poesias vivas
florescendo a noite azul


 


Adriane Lima





Arte by 

Lamento de um Blues





Estou ficando farta
de engolir palavras
de pisar em ovos
de fechar os olhos
dar com ombros
de mudar o tom
de perder o equilíbrio
e não ser eu mesma
sob nuvens de poeiras
bobeiras de gente
com asas de isopor
e coração de lata

 


Adriane Lima




Arte by  Andrew Lucas

Marulhando Asas

 
 
 
Acordei em arrepios
não era de calor
não era de frio
era o vazio
da alma
que me visitava
em forma de canção
abrindo a proteção
da senha usada
para selar o coração
 
 
 
 
Adriane Lima
 
 
 
Arte by  Igor Zenin

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

LA MELODIOSA




Para Adriane Lima


Toda alma de mulher
comporta algumas horas
ou meses de espera
e leitos de rio
e de riso
e a perda do siso
a qualquer tempo
uma hóstia salta aos olhos
da mulher: o pão
amassado com as próprias mãos, e
a argila esperançosa com que
esculpimos os dias melhores
depois que perdemos a voz
diante da beleza – o alimento natural
que nos faz tão dependentes
do sol e da chuva – e
no jardim ao lado
do fundo do deserto
fita-nos a esfinge muda:
que desta vez não propõe enigmas
mas o silêncio da saciedade
daqueles que se sabem amados
ainda que diferentes.


Lou Albergaria

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Uma ode ao homem encantado

 
 
 
 
Eu queria ter um harém
feito de pedaços dos homens
que inteiramente conheci
de um arrancaria os olhos
e colocaria naquele que
nunca me viu como sou.
 
Do outro arrancaria as mãos
e daria para o que nunca
teve um gesto de delicadeza.
 
Ao outro restaria
dar novo coração
para aprender
que amar a sí mesmo
não é a salvação.
 
Metades de homens pela metade
me fizeram não hesitar
em buscas insaciáveis
para cada um deles
deixei meu melhor
e trouxe comigo o amor que me deram
 
Minhas desistências não foram
por reflexão e sim por essência
ao me negarem o melhor que tinham
corri os riscos de buscar novas convivências.
 
- banquei minhas histórias,
algumas tristes, outras tão belas
 
Antes de morrer quero provar
que o amor existe
e acharei encantos
em um só homem inteiro
como eu entendo
cansei de fazer remendos 
 
 
 
Adriane Lima
 
 
Arte by Dalila del Valle 

Espelhos de quem ?

 
 
Somos homens demais
Para acessar fontes lógicas
Somos lógicos demais
Para reagir como bichos
Somos bichos demais
Para latir feito gente
Somos gente demais
Para assentar neste mundo
Somos mundo demais
Para raciocinar como poucos
Somos pouco demais
Para sonhar como deuses
Somos deuses demais
Para assumir nossos erros
Somos erros demais
Para pensar como loucos
Somos loucos demais
Para estancar como foscos
Somos foscos demais
Para refletir livremente
Somos medos demais
Que nos resumem a homens
Por questionarmo-nos demais

 
 
Adriane Lima
 
 
 
 
Arte by  Yoo Choong Yeul

A vibração da vida

 
 
 
A palavra é a entrada
o silêncio a penetração
o gemido a rima
o cheiro a nostalgia
as mãos impulsionam
o desejo incontido
(di)versos soltos no ar
o amor a mais pura ficção
da solidão friccional
deixaram a poesia
se amar sozinha
só lamento a falta de gozo
da alma gentil
e a inquietude da paz
 
 
 
 
Adriane Lima  




Arte by Dalila del Valle
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