quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Prova de resistência

 
 
 
E lá vem ele dizer
que estava com saudade
E porque eu não liguei
não ligou também
 
e lá vem ele dizer
que sairmos para conversar
estava fazendo falta
que minha risada alta
ainda ecoava nele
 
e lá vem ele dizer
depois de tantas horas
que precisávamos ir embora
e nossas mãos se encontraram
e nossas peles se tocaram
embora os olhos fugissem
 
e lá vem ele me dizer
que era esse silêncio desejado
dos corpos ressonando
nos lençóis lado a lado
 
e lá vem ele emudecer
ao despedir-se
em um beijo apaixonado
 
E então, eu prever
no dia seguinte:
que tenho medo de ser feliz
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Adriane Lima
 
 
 
 
 
 
 
 
Arte by  Loui Jover
 

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

O seguro morreu de verso






 Amor
tantas vezes sentimento
embargado em profundezas
nas marés do pensamento


amor
tantas vezes covardia
afogado em ondas
das gotículas de maresia


amor
levou-nos a oxidação
mesmo o coração
não sendo de metal


amor
devorou o limite do
que éramos e do que
seríamos por instinto


entendo os deuses
que suprimiam emoções
descartando,
humanas sensações


por saberem que no coração
reside o princípio e o fim
de tudo


e quem sou eu
pra falar de amor ?







Adriane Lima




Arte by Matsumoto

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Roupagem nua

 


Amar é despudor
amar é despoder
vestir outra roupagem
ceder-se ao prazer


amar até se dissolver
fazer outras viagens
buscar um novo ser


amar é uma única dor
que se vê ao nascer
ao interno do outro


se entregar a devoção
de se achar e se perder
amar é redenção


amar a carne, a alma e o caos
amar o vazio da solidão alheia
amar o desejo que em nós passeia


o macho e a fêmea inundados de verdades
amar é a vontade de ser-te
essa sede em nós de vidas inteiras





Adriane Lima





Arte by José Rivas 

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

O encontro com o vazio

 
 
Meu sentimento
é como o mar
profundidade que te nega
boca que te devora
com a intensidade
de um deus insondável
que não conheço a língua
mas minha pele se entrega
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Adriane Lima
 
 
 
 
 
 
 
Arte by  Skye Morrison

Jardins platônicos


 
 
O poema
é o retrato nu
do poeta
é sua alma
iluminada

pela aurora boreal
 
 
 
 
 
 
 
 
Adriane Lima
 
 
 
 
 
 
 
Arte by  Andrius Kovelinas
 

Escute o que não digo

 
 
Eu sabia
que se você viesse
chegaria com um sorriso
que inundaria o meu
traria um abraço terno
que meu corpo nunca
esqueceu
 
Eu sabia
que você viesse
me contaria histórias
de dor, de febre, de sonhos
falaria de tempos suaves,
escassos ou risonhos
 
Eu sabia
que se você viesse
eu contaria histórias
íntimas, guardadas
e um certo choro
os sonhos mais tolos,
e  novos planos
 
Eu sabia
que se você viesse
me deixaria em silêncio
a te olhar absorta
falaria mais do que
de costume e riríamos
até do que não tem graça
 
Eu sabia
que se você viesse
eu provaria seu gosto
mesmo contrariando
o que disse da última vez
e você renovaria meus sentidos
para que eu esquecesse
todo o mal que me fez
 
Eu sabia
que se você viesse
esqueceríamos o tempo perdido
e nos encontraríamos
entre peles, cheiros e gozos
 
Eu sabia
que se você viesse
seríamos novamente
dois românticos assassinos
matando desejos e vontades
 
 
 
 
 
 
 
Adriane Lima
 
 
 
 
 
 
Arte by  Skye Morrison

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Entre sinais




Éramos
eu e ela
desamparadas
por um
mistério de naufrágios
éramos
ela e eu
presas
por um
desejo de cais
éramos nós
ambíguas
em um mundo líquido
viramos pedras







Adriane Lima








Arte by  Annie Veitch

Furtivos






Camaleonicamente existimos
nunca conseguimos ver
o tempo passar
é ele que nos olha
e nos guarda
entre flores







Adriane Lima









Arte by DevianArt

Das coisas que não foram escritas ainda





Vai, corrija-me
diga que faltam
elos de ligações
algumas interjeições
e eu saberei ouvir


não temo o verso
que anda escasso
as razões entre palavras
perderam significados


porém, meu sentir
não quer dicionários
nem eu
ser concha acústica


o que ouço, meço e declaro
paira no vento
sob meus escombros
do passado
e fluem até sumir


vai, corrija-me
que aprendi o som
das impossibilidades
dessas pequenas coisas
que são minhas
e que
só eu sei, como ouvir



 



Adriane Lima






Arte by Gaia Alari

Maldito despertar



 
Pela manhã
ao lavar os olhos
frente ao espelho
preciso enxergar
as miragens
que moram em mim
 
começo habitar
as confissões
os lapsos
as memórias
os risos
os restos de vozes
balbuciadas do
dia anterior
 
passo as mãos pelo rosto
detenho os dedos
à margem de minha boca
ali, repousa a saliva e
a sede dos desenganos
 
Adriane Lima
 
 
 
 
 
Arte by  Gaia Alari

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Aos pedaços esquecidos

 
 
 
Eu habitante
entre versos
e descuidos
entre vales
e precipícios
 
Eu andante
de uma terra
que nunca existiu
 
Sou a de dentro
da casca
inefável asa
que em sonhos
partiu
 
Palavras soletradas
para o íntimo
de meu vazio
 
Eu ruminante
de um passado
que só me feriu
 
 
 
Adriane Lima
 
 
 
 
 
 
Arte by Sean Moro

Covardia intimista

 
 
 
Lá no alto
de nossas superficialidades
fomos livres 
 
Como galhos que se elevam aos céus
sem desejo de tocarem nada
apenas sobem em direção ao sol
não obedecendo o curso da vida
 
Fomos as sombras
desenhadas pelo silêncio
dos poemas
que nunca confessaremos



Adriane Lima








Arte by  Christian Schloe

Adentrando esconderijos

 
 
Perdi as chaves de casa
pelo simples desejo
de adentrar as janelas
 
Perdi a metade da asa
pela estranha vontade
de retornar ao casulo
 
Gestos sem sentido
que me fazem seguir
o instinto felino
das garras aparadas
pelo destino de fêmea
 
 
 
 
 
 
 
 
Adriane Lima
 
 
 
 
 
Arte by  Hugo Urlacher
 
 

Limitações






Hoje eu queria
na cápsula do tempo
fazer uma poesia


Vinda da mansidão
das chuvas internas,
das ruas e bares vazios


Onde o refrão
pudéssemos cantar juntos,
onde pudéssemos acreditar
mudar o mundo


Sendo guiados
pela mesma fome
que faz girar tudo
que se consome


A humanidade está habitando
a mesma casa e
não pisando o mesmo chão


Em cada gota de água
em cada sede de sumo,
há demonstração da força
do silencio e solidão


Não foi o tempo, foi o espaço
o limiar de civilização
as unhas negras de terra
amparando estrelas ao caírem em vão


A Esperança de um moribundo é
a absurda condensação do Domingo





Adriane Lima







Arte by John Broph


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